Publicado em 15/11/2011 (Direto da Redação - www.diretodaredacao.com)
Silêncio e cidadania
Silêncio tem ligação com cidadania? Há limites para o barulho? Há locais onde o barulho é tolerável e outros de onde deve ser proscrito?
À primeira vista essas indagações não merecem espaço nas páginas de Opinião dos jornais, páginas onde, em regra, comparecem questões muito sérias.
Entretanto, se aprofundamos a reflexão concluiremos que, atrás das perguntas formuladas, o que está em questão é o respeito que as pessoas devem umas às outras.
Este artigo foi produzido a partir da reclamação de moradores de um bairro de Vitória (Praia do Canto), mas o problema aqui mencionado ocorre em muitos outros espaços urbanos, pelo Brasil afora.
Os moradores da Praia do Canto rebelam-se contra a instalação e funcionamento de uma boate, justamente no espaço mais silencioso e aprazível do bairro, onde só existem casas e prédios baixos residenciais. As ruas Adolpho de Oliveira e Madeira de Freitas são as mais diretamente agredidas pelos sons ensurdecedores, motivo pelo qual os cidadãos, que têm casas nesse endereço, ingressaram com abaixo-assinado perante a Prefeitura pedindo providências. O economista José Augusto Freire, que mora no bairro há vinte anos, lamenta que não pode mais receber a visita da neta, no fim de semana, em razão do ruído insuportável.
O desprezo ao convívio civilizado transpõe, é claro, as fronteiras da Cidade Sol, onde o céu é sempre azul, cidade que é sonho de luz e sorriso de mulher, nos versos imortais de Pedro Caetano (Hino de Vitória).
O silêncio é indispensável à paz interior, ao descanso, à vida familiar, ao estudo e até mesmo à comunicação com o divino. O barulho excessivo provoca danos irreparáveis ao organismo.
O legislador trabalhista esteve atento ao problema quando estatuiu normas específicas de proteção em favor dos obreiros que possam ser vítimas de doenças profissionais resultantes da continua exposição do ouvido à invasão sonora.
Clubes, bares, espaços destinados à diversão de um modo geral, em todos esses lugares é possível que se exerçam as atividades respectivas, de forma respeitosa, sem agredir o ouvido das pessoas, sem perturbar a paz pública.
A consciência cidadã aponta no sentido do acolhimento espontâneo a padrões de convivência civilizada. Mas ainda assim a presença do Poder Público será necessária para exigir dos recalcitrantes o zelo pela paz alheia e assim preservar um mínimo padrão de harmonia social. Para alcançar este objetivo, a autoridade competente adverte os barulhentos, estabelece regras, multa e, em última instância, fecha estabelecimentos que teimam em desrespeitar o sossego alheio.

Sobre o autor deste artigo:
João Batista Herkenhoff, magistrado aposentado, é professor da Faculdade Estácio de Sá de Vila Velha (ES), palestrante e escritor. Autor do livro: Filosofia do Direito (GZ Editora, Rio de Janeiro)
Caro articulista João Batista Herkenhoff: parabéns pelo importante artigo. Destaco que não somente as boates e clubes produzem ensurdecedores ruídos, mas o próprio poder público concorre com isto, além de muitas vezes ignorar outros desrespeitos à privacidade e sossego coletivo ou público. Quem tem direito ao barulho, precisa pensar no direito ao silêncio. Porém é certo que muitos logo responderiam: “Os incomodados que se mudem!” Essa é uma triste realidade da educação brasileira, e incentivada ou estimulada pelo próprio poder público, especialmente o executivo municipal. Destaco o caso da minha cidade, Arcoverde (PE), Portal do Sertão pernambucano, na qual os eventos públicos promovidos ou patrocinados pela Prefeitura (assim é o dinheiro de todos os contribuintes – que gostem ou não de barulho), normalmente se situam em área residencial ou próximo destas. O pior é que, além do barulho ensurdecedor, tem-se que ouvir a “puxação de saco” ou “rasgação de sêda” de “cantores”, “interpretes” ou “locutores” serviçais do executivo municipal dirigidas mais destacadamente ao representante maior, o prefeito. Que, por sinal, também é remunerado pelo erário público, e, portanto, empregado do povo! Porém, os “cidadãos” o têm como “dono” da cidade ou do Município. Atos de sujeição e subserviência em detrimento do interesse público, mas travestido de interesse público é uma constante no universo dos municípios brasileiros, e, inclusive, neste. O Código de Contravenções Penais tipifica no seu art. 42 o direito ao silêncio bem como as sanções cabíveis aos infratores, que vai desde a prisão simples de quinze (15) dias até três (3) meses ou multa, sem prejuízos de outras sanções ou reparações cabíveis. Além de tudo isso, é comum vermos e ouvirmos durante o dia, e às vezes também à noite, pelas principais ruas da cidade o trânsito constante de veículos de difusão sonora típica ou atípica, com sons sobre propagandas comerciais ou de eventos festivos e, assim, como os que usam seus veículos com enormes cargas de equipamentos sonoros com sons estridentes e insuportáveis. Grande abraço, e congratulações.
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